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André Negrão fala sobre sua liderança na categoria Hypercar do WEC

9 Minutos de leitura

  • Publicado: 27/07/2022
  • Atualizado: 27/07/2022 às 10:18
  • Por: Isabel Reis

André Negrão, piloto brasileiro, atualmente está na liderança do Campeonato Hypercar do WEC, com a equipe Alpine. Nascido em Campinas, SP, 30 anos, ele já correu em várias categorias como Fórmula Renault, Fórmula 3 Sul-americana, GP2 Series, Indy Light. Na classe LMP2 do WEC, por sinal, ele foi campeão mundial. Além de ser também bicampeão da prova 24 Horas de Le Mans na classe LMP2.

Entrevistamos André Negrão para saber sobre as suas chances de ser o campeão da categoria Hypercar da Wec deste ano. Além disso, ele contou sobre os bastidores do campeonato e como é estar na equipe Alpine, vencendo as provas de Sebring e de Monza. Agora se prepara para Fuji, no Japão. Veja o vídeo acima ou leia a entrevista abaixo:

Como é liderar o campeonato restando apenas duas provas para o final do campeonato?

André Negrão – É fantástico. Não estávamos esperando esse resultado na etapa de Monza, depois de uma Le Mans muito difícil, caótica. A gente acabou fazendo uma prova complicada em Le Mans, muitos problemas com o carro, o que normalmente não acontece. E acabou ocorrendo justamente na prova mais glamorosa do ano. Vencer em Monza, em um momento que a equipe estava precisando, foi algo que caiu do céu. Resultado de um trabalho duro, de uma estratégia muito fantástica. Aí veio essa segunda vitória do ano. A outra foi em Sebring, na abertura do campeonato. Fizemos um terceiro em Spa, um quinto lugar em Le Mans e a segunda vitória do ano em Monza. Estamos liderando o campeonato, mas com uma diferença pequena com relação à Toyota, de apenas 10 pontos. Agora vamos para o Japão e depois o Bahrein, que tem uma pontuação um pouco maior por ser uma prova mais longa: no lugar de 25 pontos serão 35 pontos. Nessa etapa será decidido quem será o campeão mundial.

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Como é essa disputa entre equipes? 

André Negrão – É uma disputa enorme e os carros são diferentes. Estamos na Hypercar, mas o nosso carro tem oito anos, sem sistema híbrido, tem um tanque com menor capacidade de combustível, apesar que ele consome mais pelo fato de não ter baterias para ajudar. Quando fazemos um bom trabalho, uma boa estratégia, vencendo um carro muito mais avançado que o nosso, temos muitos motivos para comemorar. Em Monza a corrida foi de seis horas, muito difícil. Se pensar que terminamos com apenas 1,7 segundo na frente! Uma corrida muito acirrada.

André Negrão
André Negrão foi campeão mundial da classe LMP2

Esta é a segunda temporada da Alpine nos Hypercars, e agora o time consegue vitórias, o que não ocorreu ano passado. O que mudou para passarem a vencer corridas?

André Negrão – O ano passado foi de transição da equipe para a Hypercar. Teve essa troca de nome de LMP1 para Hypercar. São hipercarros com uma tecnologia que está sendo adotada no campeonato e que depois será passada para os veículos de rua. Por isso trocaram o nome de LMP1 para Hypercar. A nossa equipe teve um crescimento muito grande do ano passado para este ano. O ano anterior foi de aprendizagem para ver como a equipe e o carro iam se comportar. São muitas coisas para olhar durante a corrida. A LMP2 é uma categoria inferior a essa de hoje. Você não tem tantos dados, tantos parâmetros, então ela é muito mais fácil. Então, ao passar para a LMP1 a gente teve um crescimento já muito grande no ano passado, terminando o campeonato mundial em terceiro lugar. Neste ano, fizemos muitos testes antes de começar o campeonato para desenvolver pneus e os novos sistemas. Também foram colocados alguns componentes para poder economizar mais combustível. Com isso chegamos em uma fase de crescimento constante.

Correndo em trio e em provas longas, como é feita a divisão e a estratégia na troca de pilotos? Pode nos contar como funciona esse bastidor na Alpine?

André Negrão – Não existe isso de quem vai andar mais ou menos. Depende muito do que está acontecendo na corrida. Por exemplo, se tem um Safety Car! Tem uma outra coisa também que se chama Full Course Yellow, que é quando o Safety Car não entra, mas a pista toda está sob bandeira amarela e somos obrigados a manter 80 km/h. Isso influencia qual piloto vai entrar, se entrará um pouco antes. Cada equipe tem o seu jeito de trabalho e de pensar na corrida. Nos treinos a gente faz tudo por igual. Aquele que vai para a classificação acaba rodando um pouco mais no terceiro treino, para verificar o carro, saber se está tudo certinho. Acaba tendo um pneu novo a mais para aquele piloto que fará a classificação. E os outros dois pilotos ficam trabalhando mais na parte de corrida. Não tem um primeiro piloto ou segundo piloto. Nessa corrida de Monza, por exemplo, eu fui o que menos dirigiu: não fiz a classificação e a largada. Mas eu fiz a largada de Spa.

 

Hypercar da Alpine na WEC: André Negrão lidera o campeonato deste ano.

Vocês têm que trabalhar muito unidos?

André Negrão – Sim, essa parte da Endurance é uma das mais importantes. Quem vem de uma fórmula, que é só você, começa a ter que dividir o carro com os outros pilotos. Mas isso se aprende. Ter uma amizade, se dar bem com os outros dois pilotos, é algo que muda muito o jeito de trabalhar. Quando acontece de ter pilotos com um passado turbulento, que já brigaram, que já tiveram algum desentendimento, é um pouco mais complicado. Um time bom é de pilotos conectados, que gostam de sair juntos, para jantar, comer uma pizza. Isso também conta muito. Na minha história na Alpine eu sempre me dei bem com os meus companheiros.

O Balance of Performance é uma preocupação para as últimas duas corridas do ano?

André Negrão – O famoso BOP, que é estipulado com a FIA e Automobile Club de l’Ouest (ACO, dona do campeonato FIA WEC). Temos a preocupação, sim, porque provavelmente haverá uma redução de cavalos para a corrida de Fuji, no Japão. E isso normalmente só é estipulado há uma semana ou cinco dias antes da corrida. Só mais perto é que vamos saber de quanto será essa redução de potência ou de aumento de peso, dependendo do que eles vão estipular para nós. Durante o final de semana da prova eles também podem mudar.

A Glickenhaus não correrá a parte final do campeonato. Com menos carros no grid, isso pode ser um fator favorável para manter a ponta do campeonato?

André Negrão – Sim, com certeza. Em Monza acabou explodindo o motor do carro deles, caso contrário eles iriam ganhar aquela prova. Esse carro anda muito bem em retas e nós não temos esse motor. Nós somos muito bons de freadas e de curvas de alta performance. O fato de eles não irem para o restante do campeonato  dá um alívio, com um rival a menos. Mas para as pessoas que vão assistir, que seguem o campeonato, é um hipercarro a menos, o que acaba tirando um pouco de emoção. Por outro lado, sabemos que a Peugeot entrou em Monza e vai continuar até o final do campeonato. E na última etapa teremos a volta da Porsche, com mais dois carros. Aí ficará um grid maior ainda.

A equipe Alpine que corre com três pilotos: é fundamental a união entre eles, segundo André Negrão

Com a mudança de regulamento, diversas outras montadoras terão equipes tanto no WEC quanto na IMSA. Como você vê esse aumento de interesse nas corridas de longa duração?

André Negrão – Sim, há muito interesse porque agora há uma categoria que permite usar os carros tanto nos Estados Unidos como na Europa. Isso chamou a atenção de muitas construtoras porque foi possível juntar as duas coisas e fazer um campeonato só. Nós que estamos fazendo WEC este ano, se tivéssemos os carros novos, poderíamos fazer as 24 Horas de Daytona. Assim como o pessoal de Daytona pode vir fazer a WEC aqui. Isso chamou a atenção de muitas marcas como a BMW, Porsche, Peugeot, Cadillac, Acura. Essas marcas que já estavam nos EUA também vão poder correr na Europa. Outra coisa é que os carros agora vão andar um pouco mais devagar para terem uma economia de freios, de motor, isso também chamou a atenção dessas marcas.

Esse também seria o motivo para cada vez mais pilotos brasileiros estarem procurando o Endurance, seja em hipercarros, protótipos ou GTs?

André Negrão – Os pilotos têm que ir para onde há possibilidades de entrar em um campeonato, de fazer uma carreira. Eu tive esse pensamento quando ingressei em uma categoria de fórmula. Você sempre quer ir para a Fórmula 1. E nem todos vão chegar lá: não está no momento certo, não tem o dinheiro para participar porque nos primeiros anos você é um “paydriver”, pagando para correr. Mas muitas vezes conseguimos ter futuros gloriosos em outras categorias. O mundo da Endurance está tomando esse caminho. Muitas construtoras entrando sempre com dois carros, aí são seis pilotos por equipe, mais dois pilotos reserva. Tem muita vaga surgindo. Os pilotos estão mudando um pouco o rumo e indo para GT, Hypercar, LMP2.

Com a unificação de regulamentos, é uma ideia sua ou da Alpine correr em provas nos Estados Unidos (24h de Daytona, 12h de Sebring)?

André Negrão – Sim, eu vejo isso acontecendo. Um atrativo para divulgar a marca nos Estados Unidos. Não tem porque não irem. São campeonatos grandes nos EUA, com muito público.

Já a partir do próximo ano?

André Negrão – Não, em 2024. O próximo ano será de testes de desenvolvimento do novo carro.

A WEC e seus Hypercars e Protótipos têm a possibilidade de desenvolver equipamentos e tecnologias muito mais próximos dos carros superesportivos de rua, do que as categorias de fórmulas, como a F1?

André Negrão – Os dois desenvolvem tecnologias. Mas são coisas diferentes, com custos muito diferentes. Óbvio que a Fórmula 1 tem uma tecnologia ainda mais avançada. Mas a Endurance nessa parte de sistema híbridos está muito mais avançada do que a F1.

Alpine vence 6 Horas de Monza com André Negrão
André Negrão no cockpit de seu Alpine A480 da WEC – Foto: Joao Filipe / DPPI / divulgação

Como o regulamento da WEC permite mais liberdade de criação, isso exige mais do piloto no desenvolvimento e acerto dos carros protótipos/Hypercar?

André Negrão – A gente participa do desenvolvimento. A equipe coloca componentes novos no carro, mas quem testa na pista somos nós, pilotos.

Qual mensagem você gostaria de passar para nossos leitores? Muitos deles pilotos, inclusive.

André Negrão – Para aqueles que vão começar eu digo: não desista. O automobilismo é um esporte muito ingrato. Eu nunca tive grandes resultados na F1. Mas quando eu me encontrei na Endurance, tive a oportunidade de mostrar o meu trabalho. Por isso, procure o seu sonho, não desista. Tem uma frase no nosso carro que é: “Never give up”, ou seja, “Nunca desista”. Mesmo que muitas vezes o automobilismo te derrube, não te traga os resultados, com a equipe errada na hora certa ou vice-versa. Ou com o carro que quebrou no momento mais importante. Existem sonhos além da Fórmula 1. Eu fui até o final e não cheguei. Nem por isso eu desisti. Tem muitas formas de se tornar um profissional do automobilismo e que não é só na Fórmula 1.

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