O presidente da CBA, Waldner Bernardo, o Dadai, fala novamente a esta coluna, desta vez sobre a polêmica envolvendo o GP do Brasil. Ele explicou qual a posição dessa entidade frente às suas funções na FIA. Comentou sobre as dificuldades de renovação do contrato com o promotor nacional para a realização da prova em São Paulo. Mas, o importante, Dadai faz uma avaliação positiva sobre o futuro do GP do Brasil, afinal trata-se da maior audiência mundial da Fórmula 1 e com enorme potencial de negócios.
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Acompanhe esta entrevista e compreenda um pouco mais sobre os bastidores, se a não realização do evento pode afetar o automobilismo nacional ou porque os jovens pilotos atuais têm muito interesse em provas de turismo e não mais tanto assim em fórmulas.
O que está sendo feito pela CBA e por outras entidades, como a FIA, para manter a Fórmula 1 no calendário do próximo ano?
Dadai – É importante que as pessoas entendam como funciona a dinâmica do negócio. Porque muitas vezes a entidade é cobrada por situações que ela não tem nenhuma responsabilidade. Na Fórmula 1 existe a FIA e há uma empresa internacional, a Liberty, que promove o evento. É o mesmo que acontece com a CBA, que faz concessões à Vicar para promover a Stock Car, ou para a Mais Brasil realizar a Truck. A CBA, assim como a FIA, também pode promover eventos, como acontece com o Campeonato Brasileiro de Kart, uma categoria estratégica que organizamos diretamente. Ou como aconteceu com o campeonato de Velocidade na Terra: criamos um produto que não existia ligado ao agronegócio, com potencial enorme, em uma região onde não havia nem kart. Com a FIA não é diferente. Ela realiza campeonatos como o Mundial de Kart ou pode fazer parcerias com entidades ou com promotores locais. Existem casos em que a FIA promove e, outros, em que a FIA comercializa para terceiros. No caso da Fórmula 1, a FIA comercializou o direito de promoção para a Liberty. E a FIA cuida da parte técnica e esportiva. Entretanto, toda a parte comercial é feita pela Liberty. Por outro lado, para que um Grande Prêmio aconteça em um país, a Liberty necessita de um promotor local, que pode ser privado, ou uma entidade (como é o caso do GP de Mônaco, cujo promotor é o Automóvel Clube daquele país). No Brasil, o promotor sempre foi a Interpub, que é a empresa do Tamas Rohonyi. A CBA tem acesso a pouquíssimos detalhes dos contratos existentes entre o promotor do Grande Prêmio do Brasil e a Liberty.
Então a CBA não tem nenhuma influência na FIA para opinar sobre o GP?
Dadai – Quando há um GP para acontecer, a FIA avisa a CBA e informa quem é o promotor, para que seja assinado um documento, que depois é devolvido para que a FIA aprove em assembleia (que ocorre no final do ano). Só depois de aprovado é que a CBA poderá dar início ao processo para que a prova seja realizada em termos técnicos e esportivos. Se qualquer elo dessa cadeia for quebrado, a CBA não tem o que fazer. Todos sabem que havia uma negociação de contrato entre a atual promotora mundial, que é a Liberty, e a empresa do Tamas. Esse contrato não foi renovado (veja a coluna da Bel: A delicada situação da Fórmula 1 no Brasil e no mundo).
Então foi esse o motivo para não ocorrer o GP aqui este ano?
Dadai- Há também outras situações, como a questão do Covid-19. Houve uma pressão muito grande para que as provas internacionais não viessem para o Brasil. Isso aconteceu com o Mundial de Kart, por exemplo, cujos pilotos não quiseram vir para cá. Tanto que, este ano, a prova do Mundial que estava reservada para o Brasil acontecerá em Portugal (mas já temos fechada a data do mundial para o próximo ano). Com a Fórmula 1 não foi diferente. Existia um pool de três corridas, com Estados Unidos, México e Brasil. Há um custo principal que é compartilhado entre esses três países. Realizar o GP sozinho por um deles fica inviável. O GP não está acontecendo aqui e também não está lá, incluindo os EUA, onde fica a sede da Liberty. E não está ocorrendo em vários outros países, como Mônaco. Ou seja, esse não deve ser tratado como um problema pontual do Brasil. E agora, a reboque, tivemos a notícia de que a Globo não será mais a empresa com direito de transmissão. Ou seja, uma série de situações, inclusive da economia mundial, levaram a não realizar o GP do Brasil este ano.
E para o próximo ano? Como fica a realização do GP?
Dadai – Basta pagar e ter um autódromo com condições técnicas para existir uma prova de Fórmula 1 em qualquer lugar do mundo. Alemanha e França já ficaram sem grandes prêmios. Não há mais o peso do glamour nessas provas: “No Money, no race”. A FIA tem o calendário, tem a categoria, e deixa a comercialização com a Liberty. A tradição nada tem nada a ver com isso. Se tivesse, a prova de Mônaco teria acontecido. Já ficamos sem corrida em Spa-Francorchamps. Entretanto, entraram o Vietnã e a China, porque eles pagaram! Simples assim.
Qual impacto que a não realização do GP do Brasil pode criar para o automobilismo nacional?
Dadai – Diretamente para o automobilismo perde-se a manutenção dada ao autódromo de Interlagos por conta da Fórmula 1. Esse benefício se estendia a todas as outras categorias. Mas perde-se também o ativo de não ir ver um evento desse porte. Porque mesmo não tendo nenhum piloto brasileiro correndo na F1, os números de audiência e de procura de ingressos nunca diminuíram. O brasileiro gosta disso. O Brasil só perdeu o primeiro lugar de audiência da Fórmula 1 no mundo, quando a China transmitiu em TV aberta. Mas aí também é difícil comparar a população da China com a de qualquer outro lugar. Ou seja, o produto automobilismo quanto a negócio e quanto à pujança esportiva é um ativo que efetivamente vamos sentir falta. Mas não tenho como chegar na FIA e dizer que quero fazer o GP aqui. Se pudesse, eu faria três corridas de F1 no Brasil. Mas existem contratos comerciais. O profissionalismo hoje é muito grande, tanto da gestão da carreira de um piloto como na realização de uma corrida. Acho muito injusto que se comente que a CBA não está fazendo nada para que a corrida acontecesse. As pessoas precisam entender qual o papel da CBA dentro do GP de F1.
Não ter mais provas da F1 pode afetar o automobilismo nacional na questão dos jovens pilotos, do futuro, uma vez que eles sempre almejam a Fórmula 1 como objetivo?
Dadai – Não consigo mensurar o quanto isso pode atrapalhar. Mas acho que os pilotos brasileiros começam a olhar mais para o automobilismo nacional, para uma Stock, onde tivemos o retorno do Rubinho, uma participação do Massa, a entrada do Zonta. Muitos jovens pilotos estão fazendo a transição do Kart para a Stock Light. Vamos dizer que a própria F1 é uma devoradora de talentos. Eu costumo citar o caso de um piloto brasileiro, o Luiz Razia, que estava lá fora preparado para fazer o teste de admissão. Já estava vestindo o macacão, quando recebeu a notícia de que outro piloto tinha pago mais do que ele. E o Razia ficou de fora. Nós somos uma fábrica de talentos. Mas o modelo de negócio desse sonho chamado Fórmula 1, depende muito do dinheiro. Então o que vamos fazer? Fomentar esse sonho, para que os nossos pilotos vão ate lá bater na trave e voltar? Ou vamos cuidar para deixar um automobilismo nacional forte? Uma das coisas que mais me está deixando feliz nesse fim de mandato é o Turismo Nacional, que tem mais de 70 carros correndo.
É realístico montar um autódromo a partir do zero no Rio de Janeiro?
Dadai – Empresas como a Liberty não realizariam negócios aqui no Brasil se elas não entendessem que tudo faz sentido. Imagino que a Liberty deve ter um cuidado muito grande para negociar com empresários e analisar a possibilidade de um novo business. Se as autoridades brasileiras aprovarem um projeto como esse autódromo no Rio de Janeiro, nós da CBA só podemos apoiar. Afinal trata-se de uma iniciativa de trazer uma nova praça de esportes para o Brasil.
Então está caminhando o projeto de construção do novo autódromo? E a Liberty estaria negociando com esse grupo?
Dadai – Acredito que sim. É o que estamos acompanhando pelos meios de comunicação. Vemos que isso está cada vez mais próximo de acontecer, porque se a Liberty não renova com São Paulo, alguma coisa tem que acontecer. Acho que a Liberty não abandonaria o projeto de um Grande Prêmio, sabendo do potencial comercial que existe no Brasil.
E o fato da Globo não mais transmitir? Qual seria a outra opção para a Liberty?
Dadai – Novamente eu digo que a Liberty sabe o que faz. Ninguém daria um “tchau” para a Globo sem ter uma carta na manga. Em breve, esses anúncios serão feitos e vamos entender o que vai acontecer. Essa coisa de TV aberta e TV fechada desmistificou muito. Antigamente os pacotes das TVs fechadas eram proibitivos. Hoje, por R$ 39,00 se consegue um pacote básico de canais. Popularizou, assim como o celular, que antes era caro e agora todos têm.
Dá então para concluir que, com relação ao GP do Brasil do próximo ano, as coisas estão caminhando?
Dadai – Acredito que sim. Mas veja, eu não tenho acesso a informações privilegiadas. O que estou vendo é o que todo mundo sabe: que nós tivemos um Grande Prêmio cancelado, que aconteceu esse litígio entre o atual promotor e a Liberty e que isso, inclusive, não está ajudando na renovação do contrato para o próximo ano. Mas acho que ninguém joga fora um produto como o GP do Brasil. Ninguém joga fora um mercado como o Brasil. Ninguém joga fora a maior audiência mundial da Fórmula 1.
Quer comentar algo mais, para finalizarmos?
Dadai – Gostaria de falar sobre a miopia que existe em relação à grandiosidade do automobilismo nacional. Qual será o caminho certo? O de olhar para o nosso automobilismo ou para o automobilismo dos outros? Isso aconteceu com a Argentina, de focar no automobilismo do próprio país, e o esporte a motor continua sendo um grande sucesso por lá.
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