Fabiana Ecclestone foi convidada por Mohammed ben Sulayem, Presidente da FIA, para ser a Vice-presidente de Esportes da entidade para a América do Sul. Não faltaram motivos para essa indicação, uma vez que Fabiana tem larga experiência no automobilismo. Ela trabalhou durante 25 anos na organização do GP do Brasil de Fórmula 1. Também atuou nas Comissões de Recordes e de Mulheres, além de cuidar do Clube da Mobilidade, todos da FIA.
Fabiana é esposa de Bernie Ecclestone, o todo poderoso da F1: empresário, dirigente esportivo e ex-piloto britânico. Bernie foi presidente e CEO da Formula One Management e da Formula One Administration. É acionista da Alpha Prema, um dos empreendimentos que gerenciam a Fórmula 1.
Nesta entrevista, Fabiana fala sobre a sua brilhante carreira no automobilismo e também explica quais são os seus objetivos no importante cargo atual. Veja abaixo em vídeo ou leia a entrevista na íntegra:
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Você trabalhou durante 25 anos nos GPs de F1. Como aconteceu de se tornar Vice-presidente da FIA para a América do Sul?
Fabiana Ecclestone – Durante todo esse tempo que eu trabalhei no GP do Brasil de Fórmula 1, também tive a oportunidade de ser representante do Brasil junto com a CBA, no Conselho Mundial de F1, além de participar da Comissão de Recordes da FIA e da Comissão de Mulheres no automobilismo. Também foi fundado nesse período o Clube de Mobilidade da FIA, parte que cuida dos motoristas, que usam as vias públicas. Fazemos muitas campanhas de segurança no trânsito. Com toda essa experiência, quando o Sr. Mohammed se candidatou ao cargo de presidente da FIA, ele me chamou e disse que precisava da minha ajuda. Falou que eu conhecia muito bem a América Latina, também trabalhando nos GPs do Brasil de F1. E que ele gostaria muito de contar comigo. Aceitei! Sei que é um desafio, mas fiquei muito contente de ele ter lembrado de mim.
Algumas pessoas me perguntam sobre o fato de Mohammed ben Sulayem ser árabe e muçulmano, o que remete a um certo radicalismo. O fato de ele ter indicado você, uma mulher, para esse cargo revela um lado moderno e inovador da FIA?
Fabiana Ecclestone – Existe muito preconceito no mundo hoje. Conhecendo o Sr. Mohammed, digo que ele é uma pessoa aberta, internacional, independentemente de religião ou de onde ele vem. Também é aberto a inclusão das mulheres. É importante na FIA ter um presidente que não é um europeu. Isso abre os horizontes da FIA e já estamos sentindo isso por intermédio do Brasil, da América do Sul e de outros países. Ele não tem uma visão voltada para a Europa. O Sr. Mohammed, com a sua experiência em rali, como uma pessoa que viajou pelo mundo, consegue enxergar a FIA realmente como um órgão internacional e que dá igualdade a todos os clubes. Ele é mesmo uma pessoa aberta, muito interessante de se conhecer, muito experiente no automobilismo, até porque ele era piloto.
Você continua atuando nos outros cargos, nas comissões, ou está dedicando ao automobilismo da América do Sul?
Fabiana Ecclestone – Para mim quanto mais se conseguir incluir novas pessoas, melhor. Então, ao invés de acumular cargos, eu preferi indicar outros profissionais para as comissões. No caso da Comissão de Mulheres no automobilismo, por exemplo, indiquei a Bia Figueiredo, que assumiu há um tempo. Quanto mais pessoas conseguirmos trazer para a América Latina com representação internacional, será muito melhor.
Recentemente foi feito o congresso da FIA em Cartagena, Colômbia, onde foi destaque a atuação da CBA, que está trazendo apoiadores para o automobilismo, como o BRB. Isso acontece em outras entidades pelo mundo?
Fabiana Ecclestone – Primeiramente, quero parabenizar o Giovanni Guerra, presidente da CBA, que está fazendo um excelente trabalho. Eu tive oportunidade de trabalhar com outros presidentes da entidade, e sei o quanto é difícil. Mas o Giovanni está desempenhando isso muito bem. A CBA está em boas mãos e o trabalho está sendo bem executado. Na Europa existem inúmeros clubes que há anos fazem parcerias com empresas como seguros, bancos e diversos setores. Na América do Sul, o BRB está sendo pioneiro em investir no esporte. E a nossa ideia é levar esse conceito para toda a região. O Sr. Paulo Henrique, presidente do BRB, gentilmente aceitou o convite de fazer uma apresentação em Cartagena, onde todos os clubes da América do Sul estavam presentes. Serviu para que entendessem o potencial dessa ação e para mostrar a eles as possibilidades que existem. Eu vejo isso crescendo muito rápido porque gera oportunidades para todas as pessoas envolvidas. É muito fácil a gente sempre ver o piloto. Mas por trás dele tem o mecânico, um chefe de equipe, tem a pessoa que limpa o carro, outros que organizam o boxe, tem o motorista da carreta que trouxe o carro para correr, tem o pessoal de assessoria de imprensa, tem a equipe do catering. Ou seja, existem muitas outras pessoas envolvidas. É uma indústria muito grande. E o BRB enxergou essa oportunidade de desenvolver um projeto muito bacana, que estamos tentando levar para toda a América do Sul.
Antes da sua chegada, a atuação da FIA para as regiões latina e sul-americanas sempre ficou mais voltada para o automobilismo da Argentina, do Uruguai e do México. Isso já está mudando a partir de agora?
Fabiana Ecclestone – O Brasil vem se destacando. O trabalho está sendo aprimorado. O que estamos tentando fazer é levar todos esses projetos e trazer um padrão de qualidade para toda a América do Sul. É claro que sempre um país ou outro vai se destacar, mas sem deixar segregar por conta do seu representante. Eu tenho que tomar esse cuidado. Sendo brasileira eu tenho muito orgulho do que está sendo feito no Brasil, mas eu sempre quero um intercâmbio. Se a CBA está fazendo um bom projeto, se o Uruguai tem um bem legal, vamos levá-los para outros países. Precisamos ser muito coerentes e levar as oportunidades para todos os países, considerando a realidade de cada um, que é bem diferente uma da outra.
Existem muitas ações já acontecendo atualmente, integrando o automobilismo brasileiro com o dos demais países sul-americanos. O que você pode contar de mais novidades para nós?
Fabiana Ecclestone – Tudo isso é muito novo. Mas é o que estamos tentando fazer: levar o que é bem-sucedido para tornar sul-americano. A Fórmula 4, que já está correndo no Brasil, a nossa intenção é torna-la sul-americana. Terá o Rally dos Sertões com etapas fora e teve a Porsche Cup, que foi a mais recente, na Argentina. Mas a ideia é cada vez internacionalizar mais esses campeonatos. A Regional Cup de Kart vai começar de novo como brasileira, mas a ideia é expandir para os países vizinhos. O meu trabalho é tentar fortalecer a região como um todo para ter volume e participar dos campeonatos mundiais.
O que você pode falar sobre o Regional Cup de Kart que o Brasil vai realizar nos moldes da F4?
Fabiana Ecclestone – Essa é uma iniciativa brilhante. Precisamos parabenizar o Felipe Massa porque na época de o projeto ser aprovado ele era o presidente a Comissão de Kart, um trabalho incansável dele. Ele entende a base do automobilismo para que possamos vir a formar campeões de Fórmula 1. Mas formar essa base sabemos que é muito caro, difícil. Existem pilotos jovens muito competentes, mas que os pais não têm condições de mandá-los para fora, para correr. E também muitas famílias não querem que o filho muito jovem vá morar sozinho na Europa. A Regional Cup atende justamente essa necessidade de os jovens talentos correrem no seu país. A prova vai acontecer inicialmente no Brasil, e depois na América do Sul, com os mesmos padrões da FIA, mas pagando com moeda local. São várias vantagens: não tem que se deslocar, consegue pagar na sua moeda. É uma grande oportunidade para buscarmos novos talentos e daí, sim, uma vez que se estabeleçam no kart, seguirem para novas categorias, conseguindo fazer tudo isso dentro do Brasil.
Hoje temos um campeonato de pista de fato continental, que é o TCR. Como você avalia a categoria?
Fabiana Ecclestone – Eu inclusive fui ao Brasil para visitar a etapa sul-americana. Esse é ao contrário: já nasceu sul-americano e o próximo passo será o de ser uma TCR brasileira. Mais uma categoria nascendo. Esse campeonato é fantástico porque é muito inclusivo, a sua qualidade é muito boa, competitivo, a organização é impecável. Trata-se de um campeonato muito seguro, que é importante lembrar, porque um dos papeis da FIA é estar de olho na segurança. Queremos expandir, mas com qualidade e segurança.
Estamos há alguns anos sem brasileiros na F1. Outros países da América do Sul não chegam à categoria máxima desde os anos 1990. Está sendo feito um trabalho para que esse quadro se reverta?
Fabiana Ecclestone – Quando o Sr. Mohammed assumiu a presidência da FIA, uma das propostas de campanha dele era exatamente isso: crescer o automobilismo. Para chegar na F1 o piloto precisa começar em algum lugar. Nosso foco hoje é crescer o esporte a motor, seja fazendo slalom de kart em um estacionamento de shopping, para que alguém possa ver o quanto um desse meninos pode ser bom. Dai ele vai para outra categoria, chega em um training, até ter a oportunidade de se tornar um piloto profissional. Queremos abrir oportunidades. Somente com volume, com uma grande quantidade de participantes que vão surgir os novos Felipe Massa. Os novos Hamilton e os novos talentos. A gente foca na F1 há muitos anos, mas todas as categorias são muito importantes. E existem várias internacionais em que não temos pilotos brasileiros. E ainda menos mulheres brasileiras correndo fora. Hoje em dia ainda existe a visão de que é um esporte muito caro, “não é para mim”, tudo muito mistificado. O nosso trabalho é fazer com essa pessoa que é talentosa, que quer correr como projeto de vida, que ela tenha essa oportunidade.
Em resumo, como você vê o futuro do automobilismo brasileiro a curto e médio prazo?
Fabiana Ecclestone – A curto prazo acho que tem bastante coisa acontecendo. Eu estou muito otimista com todas essas novas oportunidades que acabamos de falar. A médio e longo prazo eu imagino que isso vai dar retorno. Os novos nomes vão começar a surgir. Na Fórmula 4, por exemplo, já existem nomes aparecendo. Com isso, as pessoas das categorias internacionais começam a olhar para os novos talentos. Se não tem os talentos sendo formados, os managers que vão atrás desses novos pilotos, eles não se importam em visitar o esporte e saber o que está acontecendo. Mas com uma qualidade boa que estamos formando eu imagino que esses meninos vão começar a ir para a Europa e vamos voltar novamente a ter vários nomes no esporte internacional.
Que mensagem você passaria para os leitores da Racing, que são apaixonados pelo esporte a motor?
Fabiana Ecclestone – Eu gostaria de contar com o apoio de todos porque a nossa missão é fazer um esporte inclusivo. Para que as pessoas realmente possam participar e gerar oportunidades. Só abrir portas e trazer gente para o nosso mundo de automobilismo. Mas digo isso em todos os níveis. A parte de ser piloto é fantástico, mas existem outros níveis. Eu sempre trabalhei na organização, na parte de escritório. Tem tantas outras coisas, como na parte de voluntários. Precisamos muito de pessoas que entendam os regulamentos, de médicos que fazem a parte de apoio, existem várias outras maneiras de se conviver com o esporte. Eu deixo aqui o convite: venha conhecer o nosso esporte e sabia como você pode participar, se envolver, porque você vai gostar.
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